A Brasilidade Está Aqui!
Eu sou muito fã das crônicas da Becky Korich, tiete declarado e sem vergonha mesmo. É uma das melhores cronistas dessa safra. Eu sempre corro para abrir os links e me deliciar com a leitura. A última dela falava que “Quando a Vai-Vai for para a avenida, eu vou-vou para o meu canto…”.
Ela soube pintar muito bem o meu sentimento: eu adoro a anarquia criativa carnavalesca com toda a pulsão criativa que nasce do caos festivo, mas prefiro ficar em ambientes mais calmos, mas igualmente artísticos. É bom para a minha criatividade, para as minhas emoções…
Entender as próprias limitações é importante para a minha sanidade mental, e essa lição tão legal parece que a Becky descreveu… Foi tão legal que deu até aquela invejinha boa: era o que eu sempre quis escrever, mas me faltavam palavras, sonhos e criatividade!
Vou resumir toda essa ensaboada que dei: adoro o Carnaval, mas prefiro acompanhar os bloquinhos e desfiles de lugares mais sossegados… Parece um adubo que enche meu sorriso de Esperanças e me prepara para a grande safra literária do resto do ano.
Talvez seja esse o significado de “o ano só começa depois do Carnaval!”… O Brasil tem o ano-novo civil, mas também tem o cultural: o carnaval é o marco desse fim/início tão nosso… A partir da quarta de cinzas, um novo ano, novinho em folha, se abre pra gente! Possibilidades, sonhos, vida que segue até o próximo!
Entre uma folia na sala e outra, corremos para a Sala São Paulo. Fomos assistir um espetáculo de dança com a Cia. Déborah Colker, coberta com a melhor musicalidade da OSESP. O Marcelo Lopes me explicou que a Déborah passou os últimos anos viajando o Brasil todo e descobrindo sons, cores, instrumentos e experiências! Fez uma misturança com a música russa modernista de Stravinsky, e projetou o espetáculo.
No vinho de depois, encontrei um casal de amigos, a Fabi e o Rodolfo, e a gente, ainda impactado, nem teve tantas palavras sobre isso. Acho que a emoção fala além das palavras da razão… Quando a gente tenta achar sentido em algumas coisas, a essência delas acaba se perdendo. A reflexão é a base sólida sobre a qual se constroem novas ideias…
Saindo de lá continuamos nossa jornada onírica, onde os sonhos e a criatividade se misturam: fomos para a pizzaria mais lírica de São Paulo – é lá que os sabores são os versos poéticos das construções pizzaiolas! Pizza antropofágica que se faz a partir da nossa realidade. É como a melhor Arte: ela cresce a partir da Brasilidade. O mais legal de lá é que é uma experiência coletiva.
A pizzaria toda acaba conversando junta… O Giovanni chegou de algum bloquinho, e já estava explicando as vantagens sociais da filantropia. Arte é coletividade humana: As melhores criações nascem daí, já dizia o Luis! A Alice, preferindo ouvir, parecia saber que o silêncio é a moldura poética da genialidade. Rubem Braga deve a ter conhecido quando falava da “escutatória”… Nessas conversas passamos, ainda mais, a mergulhar no mundo do Oscar. Ainda Estou Aqui! Que filme! Que livro! E, papo vai, papo vem, voltamos para nossas raízes…
No dia seguinte, tínhamos um encontro marcado com a Maria Augusta lá, mas é como dizem, né? “Quando o Criador ouve nossos planos, Ele ri!”…
A Deborah Colker usou bambus no espetáculo dela. Acho que também para simbolizar isso: flexibilidade e adaptabilidade. Acabamos indo jantar com outro casal de queridíssimos amigos, a Vera e o Piva. Política, Segurança e Artes dominaram a flora de nosso diálogo. Claro que desembocamos no Oscar.
No fim as Artes são o melhor ferramental espiritual para que se crie Pertencimento, Sensibilidade e Compreensão! Ela permite que a gente entenda as delícias e as contradições da nossa existência. Sempre que a nossa gente brasileira se destaca, ela bebe das fontes artístico-culturais que são nascidas no povo. É como se fôssemos sensíveis artistas, e isso é o nosso maior trunfo criativo.
Ainda Estou Aqui representa isso muito bem: apesar das dores da tragédia que Eunice e os Paiva enfrentaram, eles continuaram caminhando, buscando na sensibilidade coletiva e popular o combustível para continuar.
É aí que a brasilidade, que floresce desde a defesa de nossos povos originários, se funde à Humanidade. Acho que o Oscar do Ainda Estou Aqui é mais um verso nessa poesia do povo, tão tristonha mas tão bonita.
Sabe quem foi a primeira pessoa que me parabenizou pelo Oscar?
Minha única relação com o filme é que sou brasileiro e não desisto nunca: eu também ainda estou aqui!
Mas então, a primeira pessoa que me deu os parabéns foi uma grande amiga chilena, a Coty. E como eu falei para ela: a Brasilidade só existe por conta da Latinidade – esse prêmio é de todos nós! É da América Latina! É do Extremo-Ocidente! É do Sul Global!
É da Humanidade!
A Arte só se produz na Coletividade Popular!
André Naves
Defensor Público Federal. Especialista em Direitos Humanos e Sociais, Inclusão Social – FDUSP. Mestre em Economia Política – PUC/SP. Cientista Político – Hillsdale College. Doutor em Economia – Princeton University. Comendador Cultural. Escritor e Professor.
www.andrenaves.com
Instagram: @andrenaves.def
1 Comment on "A Brasilidade Está Aqui!"
Que delícia de ler os textos do André. Sensibilidade, verdade e inteligência