Senta no Próprio Rabo!

Senta no Próprio Rabo!

        Tem gente que senta no rabo pra falar do rabicó! Sabe esse povo que só vê problema nos outros? Sartre, irônico e casmurro, aspirando seu Gitanes, diria que “o inferno são os outros”…

            E será que não é isso mesmo? Quando a gente se acha perfeito demais, precisamos tomar um banho de humildade: os defeitos que enxergamos nos outros povoam nosso interior!

Realmente… O inferno são os outros: só no encontro com o diferente, aprendemos a enxergar que nossos defeitos são iguais!

            Dona Margarida era uma amiga da vó Rosinha. Uma professora aposentada, se portava, se vestia, com a elegância do tempo passado. Parece que era um outro tempo… Os professores eram respeitados. Eram autoridade!

            Pontas de uma saudade dessa época parecem bater em mim… Acho que estou ficando velho e bobo!

O saudosismo deixa tudo meio amarelado, sem as cores que nem sempre combinam… Ninguém sente falta do que passou! A gente só tem saudades de um mundo ideal, que existe só nas fantasias da nossa mente…

            O cabelo prateado, aquele vestido comprido, sapatos, meia calça e uma echarpe em volta do pescoço. Apesar de parecer uma Odete Roitman, ela era uma excelente pessoa!

            Estava sempre com minha avó nos mais diferentes trabalhos sociais. Cuidando do povo! Depois, voltavam para o chá no apartamento da vó. Era ali que eu a via quase sempre…

            Enquanto a erva doce soltava sua essência na água fervente, mudando a água em chá e doando seu mais precioso interior para a construção de algo novo, uma bebida que perfuma o ambiente, Dona Margarida sempre falava que no Brasil ninguém liga para a Educação!

            Claro que eu me sentia, um pouco, insultado. Eu? Não faltava, fazia lições, estudava… Eu ainda não dominava aquele estilo idiomático dela que sempre que falava “no Brasil” colocava a mesa em que estávamos num limbo suspenso…

            Não éramos “do Brasil”… Éramos diferentes! Quando a seleção ganhava a Copa, aí sim, a gente era daqui. Quando havia alguma reclamação, não! Plano Real, Movimento “Diretas Já”, Tom Jobim e Vinícius de Moraes eram coisa nossa! Criminalidade, corrupção, descanso com a educação, libertinagem: isso era coisa dos outros!

            O Brasil foi moldado no analfabetismo. Durante a época da colônia era crime, capital, inclusive, ter livros, abrir escolas ou construir máquinas para imprimir! Nossa minúscula elite ia estudar na Europa… Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e todo mundo que queria iluminar o Brasil tinha de aprender com as teorias do Velho Mundo!

A Faculdade de Direito do Largo São Francisco só nasceu com a independência. E a USP então? Com Getúlio… Dizem que fora o mais saboroso fruto da Constitucionalista!

            A universalização só veio em 1988. Ou seja, durante quase cinco séculos grande parcela de nossa gente foi trancafiada nos calabouços da ignorância e do analfabetismo. A escravidão durou tanto, em grande parte, pela ausência de uma massa ilustrada. Nossa independência tb…

            Aliás, até hoje a gente sofre com esse descaso… No Brasil ninguém liga para a Educação!

            Faz pouco tempo, fui para Jacareí visitar mamãe!

            Perguntei da dona Margarida. Cidade pequena, sabe? Todo mundo é uma grande família…

            Dessa vez ela tinha ido levar a neta numa viagem… Não sei ao certo para onde foram! O que marcou é que a neta da Dona Margarida perdeu 3 semanas de aula…

            Devem ter ido abraçar o Pateta!

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